– Realizou você, em seu novo livro, Nove, Novena, experiências que em sendo indicadas como revolucionárias na literatura. Trata-se por conseguinte, de uma obra de leitura difícil ou exigente. Ora, levando em conta as atuais condições sociais do Brasil, notadamente seu baixo índice de instrução, não acha que um livro dessa natureza acentua a dissociação entre autor e público?
– Não. Só há uma dissociação que um autor deve temer: é a dissociação entre si próprio e o real. E o caminho certo para essa dissociação é precisamente o academismo: o uso de fórmulas estereotipadas, que não o ajudam a captar o real e a nada conduzem. Em literatura, toda conquista árdua atinge o público, mais cedo ou mais tarde. E são conquistas que enriquecem o leitor, não os caminhos já conhecidos.
– Um livro mais fácil, realizado dentro de “caminhos já conhecidos”, tem muito mais probabilidades de atingir o público que um livro inovador como o seu. Acha que isso não tem importância?
– Do ponto de vista comercial, sim. Não do ponto de vista literário; nem do ponto de vista da responsabilidade do escritor. Em todas as fases de minha vida, o livro que escrevi foi sempre o melhor que me era dado realizar no momento. Se este último, Nove, Novena, abrange mais áreas de pesquisa, é que meu espírito permite agora essa aventura. Caso sua penetração seja rápida, tanto melhor. Jamais desdenhei a apreciação do público. Mas, se por acaso, essa penetração for mais lenta, não tem importância, como escritor, tenho de arrostar esse risco.
– O Desafio de Osman Lins
(Revista Escrita, ano II, no.13, 1976)
Wladyr Nader: -Gostaria que você falasse um pouco do seu próximo livro, o nome, a estória, enfim, os dados que você quisesse dar.
Gilberto Mansur: -Queria que você o situasse, principalmente em relação ao Avalovara, porque eu acho que o Avalovara criou uma expectativa muito grande.
Osman Lins: -Chama-se A Rainha dos Cárceres da Grécia. Talvez eu pudesse dizer que é um livro sobre o INPS. Os que acham que eu estaria desinteressado dos problemas brasileiros vão ficar decepcionados. Agora, não tem nada que ver com o Avalovara. É bem diferente, embora, naturalmente tenha certas conexões. A Rainha dos Cárceres da Grécia é o seguinte: uma dona de Pernambuco que é amante de um sujeito em São Paulo, escreve um romance, na companhia dele, sobre uma certa Maria de França, que deseja obter um benefício do INPS, sem jamais conseguir. Depois ela morre sem que o romance tenha sido publicado, e o amante da pseudo-autora põe-se a escrever uma meditação sobre este livro. Esta meditação é que é o livro que o leitor vai ler. E através dela, deste ensaio fictício sobre esse livro que na realidade não existe, é que o romance desta mulher vai aparecendo. Vai aparecendo em camadas e, ao contrário do que preceituam os estudos literários contemporâneos, o ensaísta não se distancia da obra, ao contrário, ele termina por integrar-se de tal modo que vem a transformar-se num dos seus personagens.